IX Congresso sobre Gênero, Educação e Afrodescendência: Narrativas e diásporas para aprender a ser-existir hoje
Aconteceu de 09 a 11 de novembro de 2022
Queremos lembrar aqui no blog o texto que trouxemos no site do IX CONGEAfro do ano de 2022:
Reflexões
“Salvar” (salavá, saravá), “salve!” ou “viva!”, vem de povos africanos de língua de tronco linguístico bantu. Suaíle, lingala, luganda, quicongo, quimbundo, umbundo, chócue, nianja, xona, ndebele, tsuana, sesoto, zulu, xhosa, ovambo, sepedi, suazi, são todas línguas bantas. Esse tronco está incluído em um grupo linguístico maior chamado benue-congolês, da família linguística nígero-congolesa, que conta com mais de seiscentas línguas. Como então acreditar que qualquer povo, chamado de africano, tenha uma cultura monolítica e fixa ou uma história única? Especialmente, como acreditar que não há vozes que saúdam, salvam, vivam suas histórias? Histórias estas que também não são binárias, assim como não são as vozes de afrodescendentes e indígenadescendentes. (Francis Musa Boakari e Francilene Brito da Silva, In: Afrodescendentes em Narrativas Cotidianas, 2021, p. 365-366).
Aproveitamos os nossos saberes produzidos em Roda para refletir sobre estas palavras e enfatizar aprendizados com o “recordar” como salvar narrativas. Entre nós, devemos estes créditos às pessoas historicamente esquecidas, pois, aprendemos a referenciar somente aqueles autores que já têm “respaldos” na academia. Falando em narrativas e diásporas nossas, afrodescendentes e indigenodescendentes, o IX CONGEAfro (2022) será um congresso internacional híbrido (agora totalmente on-line) com solicitação e diálogo, especialmente, entre Brasil/Moçambique (Universidade Rovuma, UniRovuma, em Nampula e Universidade de Pungue, em Chimoio – Moçambique), bem como, multi-universitários (UESPI, UFMA, UERJ, UEMASUL) e multi-campi (UFPI, Teresina & Floriano), envolvendo pessoas interessadas na temática do evento. Queremos aprender a nos valorizar. Com isso, nos cuidamos e protagonizamos cuidados, como arte de fazer kindezi.
Kindezi é uma arte focada não apenas no cuidado dos jovens da sociedade, mas no crescimento do Ndezi (o cuidador, aquele que pratica a arte da Kindezi). Em outras palavras, ao passo que uma pessoa desenvolve as habilidades da Kindezi, desenvolve-se a si mesmo. Ndezi deve ajudar o muntu, o “sol vivo” a “brilhar” (6); e, no processo, ele/ela aprende como “brilhar” com o poder do “sol vivo”. (ANI, 2017, s/p.).
Entre “narrativas e diásporas para aprender a ser-existir hoje” é o sub-tema do IX CONGEAfro, o qual nos convida a continuarmos em roda viva e expandir nossos sóis, nossos modos e usos de aprender-ensinar em meio às dispersões históricas, inclusive pela arte. Estas são movimentos ou instabilidades, as quais nos desafiam a (re)agirmos por meio de nossas múltiplas narrativas.
Deste modo, o Núcleo de Estudos e Pesquisas RODA GRIÔ/GEAfro: gênero, educação e afrodescendência tem sido um espaço-tempo de pessoas sábias e interessadas em coparticipar de diferentes Rodas (encontros, workshops, podcasts, minicursos e outras atividades colaborativas) a fim de contar as suas histórias, compartilhando vivências próprias e/ou estas através das contribuições de outras pessoas com interesses semelhantes, focando nas questões das mulheres, em particular as de descendência africana, as educações e as afrodescendências, nas suas ricas maneiras de ser-viver. Apresentar ideias de recordar memórias e narrar é, também, nosso modo de dizer que a RODA está mais uma vez abrindo as suas portas para participações-contribuições diversas. Porque, parafraseando o povo mende de Serra Leoa, quando pessoas interessadas numa questão se juntam em torno desta mesma, outras “coisas pequenas-grandes se desenvolvem”. Com ponderações assim, apresentamos as pretensões deste IX CONGEAfro.
O objetivo desse encontro em roda é recordar, como um ato e gesto de ação cotidiana que nos salva da complacência de tempos históricos em que pagamos com as nossas vidas a barbárie da negação dos nossos corpos-saberes. Assim, este congresso, em sua nona edição tenta para nos dizer que recordar é preciso, como ato e gesto de (re)existência, porque historicamente (re)agimos diante de todas as formas de discriminações. Nos convoca também a cuidar de nós, como as práticas humanas (humanidade e humanização) que, para alguns povos africanos e afrodescendentes, se chamam kindezi e saravá. Estas nos ajudam a entender que não naufragamos porque a memória nos traz à lembrança o que somos de fato: vidas e mundos antes das diásporas e cheias/os de narrativas salvas em nossos corpos, pelo cuidado de nós mesmos, sol nas águas diaspóricas desafiantes do existir. Somos um “nós”, não existimos em ubuntu sem esse nós. Pois, eu sou porque nós somos (RAMOSE, 2002).
Deste modo, aproveitamos algumas vivências sócio-acadêmicas como memórias-narrativas da RODA GRIÔ chamando atenção aos sub-titulos dos CONGEAfros desde 2013:
2013 – I Congresso sobre Gênero, Educação e Afrodescendência (CONGEAfro): conquistas, experiências, desafios (dias 06-07-08 de novembro de 2013).
2015 – II Congresso sobre Gênero, Educação e Afrodescendência (CONGEAfro): orgulho de ser afrodescendente - lugares e identidades (dias 03-04-05-06 de novembro de 2015).
2016 – III Congresso sobre Gênero, Educação e Afrodescendência (CONGEAfro): direito de ser nas relações de poder (dias 09-10-11 de novembro de 2016).
2017 – IV Congresso sobre Gênero, Educação e Afrodescendência (CONGEAfro): descolonialidades e cosmovisões (dias 07-08-09 de novembro de 2017).
2018 – V Congresso sobre Gênero, Educação e Afrodescendência (CONGEAfro): justiças social e epistêmica na Década dos Povos Afrodescendentes (dias 05-06-07-08-09 de novembro de 2018).
2019 – VI Congresso sobre Gênero, Educação e Afrodescendência (CONGEAfro): políticas públicas e diversidade - quem precisa de identidade (dias 06-07-08 de novembro de 2019).
2020 – VII Congresso sobre Gênero, Educação e Afrodescendência (CONGEAfro): afrodescendentes em narrativas cotidianas (dias 03-04-05-06 de novembro de 2020, no formato on-line).
2021 - VIII Congresso sobre Gênero, Educação e Afrodescendência (CONGEAfro): esperançar em crises históricas (dias 03 a 04 de novembro de 2021, no formato on-line).
E assim, nesta nona edição, onde propomos construir também, das experiências dos últimos dois CONGEAfros que foram inteiramente online, ousamos convidar, usando a modalidade hibrida, para apresentar-discutir-explicar-problematizar a temática do Gênero, Educação e Afrodescendência sob as perspectivas das “narrativas e diásporas para aprender a ser-existir hoje”.
Objetivo Geral
- Aprender a recordar-salvar nossos modos e usos de ser-existir hoje com as nossas narrativas em diásporas cotidianas, nas pesquisas, nas vivências (convivências) e na vida que tecemos. O conceito de narrativa abarca também aqui as produções artísticas humanas.
Recordar é preciso
O mar vagueia sob os meus pensamentos
A memória bravia lança o leme:
Recordar é preciso.
O movimento vaivém nas águas-lembranças dos meus marejados olhos transbordar-me a vida,
salgando-me o rosto e o gosto.
Sou eternamente náufraga,
Mas os fundos oceanos não me amedontram
E nem me imobilizam.
Uma paixão profunda é a boia que me emerge.
Sei que o mistério subsiste além das águas. Conceição Evaristo (2017, p. 11).
São nove anos de CONGEAfro e com Conceição Evaristo convidamos para mais uma grande Roda, no período de 09 a 11 de novembro de 2022, dizendo que “Recordar é preciso”. O verbo (ação) recordar aqui pretende apresentar sentidos de movimentos que as nossas narrativas em diásporas promovem em atos e gestos políticos cotidianos, uma busca por uma ética do ser-existir hoje, como o sol que brilha nas águas diaspóricas do imenso oceano da vida. Este congresso justifica-se pela necessidade de encontro consigo mesma e com outras pessoas, para nos enredarmos, num processo de sistematização das nossas curiosidades, em curiosidades epistemológicas (FREIRE, 2011), a partir de nossas narrativas. De insistirmos no exercício de dizer que nossas narrativas importam e, por isso, recordar é preciso. O CONGEAfro é esse espaço-tempo de aprender a vaguear sob nossos pensamentos, tendo o mar e outros elementos demarcadores/de transição como travessia. É esse espaço-tempo de aprender o “movimento vaivém nas águas-lembranças” como em outras ondas de vivências/convivências. É tempo-espaço de aprendermos a marejarmos os olhos, salgando o rosto e tomando o nosso gosto, nos mobilizando. É tempo-espaço de continuarmos emergindo apesar de tudo e de tanto. Eclodindo com tudo que somos e ainda podemos vir a ser-sendo. A pandemia e tantos desafios político-sanitário-cultural-educativo-artístico-sociais têm nos provocado como náufragos, abandonadas/os por políticas com discursos includentes, mas não podemos esquecer, com o CONGEAfro, que para nos emergir temos a consciência de que somos sóis ubuntu em ações kindezi de saravá. Um congresso hibrido (agora totalmente on-line) com as características descritas acima, viabilizará um sonho assim.
Equipe Organizadora do IX CONGEAfro - nov. 2022.
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